Quem anda a comer Joyce?

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Ando a comer a “Madame Bovary”. Ora vejamos e toca a andar: não sou só eu.

Camélia, jovem francesinha de 14 anos, gosta de ler cinquenta páginas por dia. Quando entregue à devassidão da leitura, se lhe dá a fome, logo rasga bocadinhos de páginas, que mastiga com deleite, para apaziguar o ratinho que lhe rói o estômago. Mais e melhor, naqueles dias de extrema angústia adolescente, Camélia destaca cirurgicamente uma página inteira do livro e come-a com o mesmo ardor com que Aquiles incendiou a “Ilíada”. Pior, se lê uma página que não lhe agrada, come-a com voracidade canibal, o que, confessa, sempre lhe dá dores de barriga.

É provável que os pigmentos das cores, os aditivos estabilizadores e os elementos tóxicos associados ao papel e às tintas sejam ingredientes de dieta no mínimo irrecomendáveis. Mas nem isso impede Violette, outra francesa, de comer capítulos inteiros, hábito que lhe ficou de uma infância abusada, deixada em casa dias e dias com os irmãos, sem comida que se visse. Hoje, descamba na escatologia e come limpas folhas de papel higiénico.

Digam-me que é irreal e que é obsceno e eu indigno-me. Admiro os seres humanos que rivalizam com o peixinho-de-prata, parasita larvar que faz dos livros o seu menu diário. Todo o ministro da cultura devia ter a boca do peixinho-de-prata e passar o dia a comer livros, atacando-lhes a capa, perfurando em êxtase hermenêutico um túnel que levasse da página 2 à 159. Eis um programa de governo para Graça Fonseca: ser o peixinho-de-prata dos nossos livros. Aliás, o livro não é nada calórico, daí a elegância do peixinho-de-prata. Segundo os especialistas, a ingestão de 500 páginas, corresponde a meia caloria. Bem menos do que uma patanisca, arroz e feijão.

E passo de uma obscuridade a outra obscuridade: Marie Sochor, artista plástico-performativa, género muito apreciado por ministros, faz sessões públicas de ingestão de páginas da sua escrita, impressas em papel sem fermento, com tinta preta comestível. As mais apreciadas são as “pages à chier”, que me atrevo a chamar “páginas cagativas”. Não serei eu a lançar dúvidas sobre o valor laxante destes eventos.

E olhem, aí vem o livro lamber a boca subversiva do hip hop. Em delicado papel bíblia, Snoop Dogg, fez um livro para enrolar, “Rolling Words”. Capa em cânhamo, papel laminado, tinta não tóxica, tudo, mas tudo – ya, meu! – totalmente biodegradável, estas “Palavras Enroladas” são mesmo para fumar folha a folha.

Picasso não comia livros, mas deu, como Deus, a arte a comer ao seu cão salsicha, um Dachshund. Armava-lhe coelhinhos em papel, pintava-os e o Dachsund, cão esteta, chamava-lhes um figo.

Se chamei Deus ao parágrafo anterior, posso jurar que não o fiz em vão. Deus deu um livro a comer ao profeta Ezequiel. Está escarrapachado em Ezequiel capítulo 3, versículos 1 a 4: “Filho de ser humano, come este rolo, vai e fala aos filhos de Israel.” E disse-lhe Deus que o seu ventre ficaria saciado, o que Ezequiel confirmou: “Comi-o e na minha boca tornou-se doce como o mel.” Em verdade, em verdade vos digo, Jorge de Sena não teria sido o profeta que foi se não tivesse comido Fernando Pessoa, tal como o profeta do nosso século XXI, se o quiser ser, há de comer Pessoa e Sena.

Termino com um parágrafo heróico. O dinamarquês Theodore Reinking, em 1644, escreveu um tratado acusando os suecos da miséria da sua pátria. Foi preso e deram-lhe a escolher: ou era decapitado ou comia o manuscrito. Não hesitou: cozinhou as páginas num caldo de carne e comeu-o, salvando a vida.

Crónica publicada no Jornal de Negócios

Vaidade e presunção, e não me arrependo. Entrevista de um editor

A revista Fluir, revista digital de literatura e artes, entrevistou-me, na minha lamentável condição de editor, para o seu número 5. A revista, que é dirigida por José Pacheco, já existe desde Setembro de 2018 e tem colaborações admiráveis. Quem me entrevistou foi a Ana Cristina Marques. Deixou-me de cara à banda quando me disse que Arturo Pérez-Reverte, num dos seus romances, fala em Lisboa com um editor português chamado Manuel Fonseca, cuja maior virtude, interpreto eu, é a sua bela e álacre mulher.  Eis a única coincidência. Seguem-se sete respostas a sete perguntas.

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O editor em animada e hilariante actividade. Na foto, além do editor rouge, Pedro Norton, Fernando Alvim, Pedro Bidarra e Henrique Monteiro
  1. A edição em Portugal compensa, ou é um esforço vão, ou obriga a mentir-se a si mesmo?

Compensou a Ulisses ter ido a Tróia, ter sido cativo dos Ciclopes, amarrar-se a um mastro para escutar a voz Teresa Salgueiro das sereias? Eis a razão pela qual ando nisto, voltar de consciência tranquila a reencontrar Penélope todas as noites e ganhar um dia a improvável imortalidade. É o que se leva da caverna editorial, que dividendos, viste-os – em 14 anos, zerinho, zero euros!

  1. Se pudesse escolher, teria preferido ser um editor no estrangeiro, ou continuaria a sê-lo entre nós?

Mal deixei de gatinhar, tinha eu cinco aninhos, deslarguei-me deste jardim à beira Atlântico plantado. Quis ser um Europeu errante em África. Voltei, com o rabo entre as pernas e um queixume brando. Seria ingrato negar agora, como Pedro três vezes a Cristo, a Pátria que me voltou a abrir os braços. Até porque houve um erro em que nunca laborei: nunca desertei da língua portuguesa em que edito.  Essa língua é o fio de Teseu, e um bocadinho de tesão, que me leva por este borgesiano labirinto de falas, escritas, livros, babélicas estantes, unindo o miúdo que gatinhava a esta terceira idade em que agora moro. Não saberia estar de pé em nenhuma outra língua

  1. E o que se faz é sobretudo apostar no que garantido, ou é possível dar a conhecer obras novas?

Mais do que apostar, quis inventar. No melhorzinho que porventura tenha feito estão alguns livros que inventei. Inventar um livro para Agustina juntando-a a Paula Rego, inventar com a Dona Mécia um livro de um Sena de escárnio e mal dizer involuntariamente ilustrado pelo próprio, atribuir a Pessoa o seu As Flores do Mal, inventar nos Livros Amarelos a rara, ou talvez única, colecção comparativa do mundo. E se os deuses deixarem que eu tenha descoberto um poeta – peço-vos que leiam Eugénia de Vasconcellos e logo João Moita – um filósofo, um romancista, aí está o que me poria de debruçado Narciso sobre o primeiro charco de água num primaveril dia de chuva.

  1. Considera-se um escritor que, paralelamente edita, ou um editor que, por vezes, também se quer dedicar à escrita?

Eu desconsidero-me. Já se viu pelas respostas anteriores que deambulo como gado transumante pela pastagem editorial. A escrita é uma leveza nefelibata, que um livro de devoção, tantas vezes lido em voz alta pela minha mãe, Alice Amália, ainda hoje me inspira. Eu sou um caso perdido de derrame melodramático, empolgam-me histórias de mártires, de barcos arrebatados pelas gigantescas ondas de homéricas tempestades, de náufragos seminus em ilhas tropicais. E que saudades tenho do herói que nos dias de adolescência prometia a mim mesmo ser. Já se vê, que sou um caso óbvio de incumprimento.

  1. O que o levou a tornar-se editor? Trace-nos em algumas palavras a aventura que terá sido a génese da Guerra e Paz.

Aprendi a fazer livros com João Bénard da Costa, na Cinemateca. Quando deixei a SIC, num acordo que os deuses inspiraram a Francisco Pinto Balsemão, decidi que já tinha uma linda idade para fazer da minha tão proveitosa vida o que bem entendesse. Juntei um mais um e deu dois, eu e a Guerra e Paz. Cá estamos. Foi vaidade, presunção e muita amizade. Os meus primeiros sócios foram os meus amigos de infância.

  1. Há um romance (O Franco-Atirador Paciente, de Arturo Pérez-Reverte) em que o autor o transforma numa personagem. Como se sente ao ver-se representado nas páginas de um livro? Essa personagem revela alguma coisa do homem Manuel Fonseca e da sua circunstância, ou é uma mentira? E se alguém se propusesse passar a obra para cinema, aceitaria fazer o papel?

Quem é esse editor de que Arturo Pérez- Reverte fala? “O” editor, em sentido abstracto? Eu mesmo, Manuel, o que muito me honraria por não conhecer Arturo, nem ele me conhecer a mim, o que suporia uma maravilhosa intriga, na qual Trump e Putin teriam de estar certamente envolvidos? Seja como for, eu, como actor, só entrarei num filme realizado pela vossa colaboradora Joana Pontes, a única a quem confiaria o supino talento dramatúrgico que ainda ninguém descobriu em mim.

  1. O que tem a Guerra e Paz na manga?

Gostava de anunciar um romance de António Lobo Antunes, mas a editora dele era capaz de levar a mal. Anuncio a Fotobiografia de Jorge de Sena. E, muitíssimo a sério, anuncio um livro político e filosófico essencial: vou publicar um livro de um sinólogo, Porquê a Europa, Reflexões de um Sinólogo, que tem tudo que ver com o mundo em que um vírus nos fez entrar: se o mundo que aí vem vai ser liderado pela China, o que é verdadeiramente a China? Que violência intestina é a sua, que feridas e guerras arrasta do passado? É um livro a que fiquei preso como a uma inescapável tragédia ficaria também.

E depois digam que não é bom comprar livros

E cá estou eu a fazer de veículo. Pela boca da Página Negra fala a boca da Guerra e Paz. Só sei que se ganham livros.

A Guerra e Paz vai oferecer dois Grandes Prémios aos seus leitores. Os nossos leitores têm sido generosos connosco, comprando livros no nosso site. Vamos retribuir, criando um Prémio Mensal e um Prémio Anual.

Ora, vejamos. Todos os meses vamos dar o Prémio Melhor Comprador do Mês ao leitor que venha comprar aqui mais livros. Começamos já em Junho e o vencedor receberá em sua casa, como oferta, os cinco livros na imagem acima.

De mês para mês, mudaremos os títulos a oferecer ao melhor comprador do mês. Os 5 livros a oferecer em Junho são:

Contradança, Cartas e Poemas de Camões, de Luís de Camões.
Da colecção Livros Amarelos, Pessimismo Nacional Portugal, um Povo Suicida, textos da autoria de Manuel Laranjeira e de Miguel de Unamuno.
O Primo Basílio, de Eça de Queiroz.
Orgulho e Preconceito, de Jane Austen.
Tenho Medo de Partir, antologia de textos de Fernando Pessoa.

Eis o regulamento:

PRÉMIO MELHOR COMPRADOR DO MÊS

  1.       O prémio é atribuído ao leitor que, em cada mês, neste caso de 1 a 30 Junho de 2020, atinja o montante mais alto de compras no site da Guerra e Paz.
  2.       O montante mínimo para que o prémio seja atribuído é 75€. Se esse montante não for atingido, o prémio não será atribuído.
  3.       Aquele montante tanto pode resultar de uma só compra do leitor, como da soma de várias compras que o mesmo leitor faça ao longo do mês.
  4.       Daremos notícia no nosso site e redes sociais da atribuição do prémio e do montante atingido, mas não do nome do vencedor, mantendo-se essa informação reservada, a não ser que o leitor queira revelar a sua identidade.

PRÉMIO MELHOR COMPRADOR DO ANO

Mas temos ainda uma segunda novidade: a atribuição de um Prémio de Melhor Comprador do Ano. Ao melhor comprador do ano vamos oferecer um prémio extraordinário: uma selecção de 50 livros a anunciar mais perto do final do ano. O regulamento é, nesse caso o seguinte:

  1.       O prémio é atribuído ao leitor que, de 1 de Janeiro a 31 de Dezembro de 2020, atinja o montante mais alto de compras no site da Guerra e Paz.
  2.       O montante mínimo para que o prémio seja atribuído é 450€. Se esse montante não for atingido, o prémio não será atribuído.
  3.       Aquele montante tanto pode resultar de uma só compra do leitor, como da soma de várias compras que o mesmo leitor faça ao longo do ano.
  4.       Daremos notícia no nosso site e redes sociais da atribuição do prémio e o montante atingido, mas não do nome do vencedor, mantendo-se essa informação reservada, a não ser que o leitor queira revelar a sua identidade.

De uma coisa estamos certos, quer em Junho, quer para o Prémio Melhor Comprador do Ano, vamos mesmo entregar os prémios: em Junho, já temos um leitor com aquisição elegível para o Prémio do Mês, como temos também uma leitora, em 2020, com compras a atingir o valor mínimo para o Prémio Anual.

Quem compra livros merece ganhar livros.

Os Mais Vendidos de Maio

Uma lista dos mais vendidos diz duas coisas: quem são os leitores e o que é a casa editora

Mas que lista tão bonita a do nosso top de melhores vendas no site da Guerra & Paz no primaveril mês de Maio.

À cabeça os dois livros que lançámos nesse mês, dois livros que floresceram como os jacarandás. Um Mundo Aflito, com texto de José Jorge Letria e as imagens pungentes de Inácio Ludgero, fotografias magníficas de um insidioso vazio, de uma aterradora solidão. Em segundo lugar, o polémico, frontal, Combates pela Verdade, Portugal e os Escravos, do historiador João Pedro Marques, um livro exemplar de racionalidade e clareza argumentativa.

Depois, dois blocos, os livros que dominaram a nossa Feira da Língua Portuguesa, este Almanaque e o Dicionário de Erros Falsos, do professor Marco Neves, o Português se Faz Favor, de Helder Guégués, de novo Marco Neves com a sua excelente Gramática para Todos, e um dos nossos campeões de vendas 2019/20220, o fabuloso Assim Nasceu uma Língua, do professor Fernando Venâncio.

O último bloco tem três clássicos, resultado ainda da nossa campanha Os Clássico Contra-Atacam: dois livros de Eça, a antologia de contos Adão e Eva no Paraíso, e o tão gentil A Cidade e as Serras. Júlio Dinis e a Morgadinha dos Canaviais está em 10º, prova de que o autor reconquistou uma popularidade que se diria perdida.

Ainda está a tempo de levar para casa qualquer um destes livros. Estão aqui três correntes que cada vez mais têm marcado o caminho que a Guerra e Paz quer seguir: um confronto com a história mais recente ou mais remota, uma ligação forte à língua portuguesa – com promessa de novos livros de Marco Neves e Fernando Venâncio ainda este ano – e a continuidade da nossa colecção de clássicos.

Um Mundo Aflito é o número um

A emoção irrompeu pelo top semanal de vendas no nosso site. Um Mundo Aflito, livro de José Jorge Letria, em que brilham, a preto e branco, mais de 60 fotografias de Inácio Ludgero entrou directo para o primeiro lugar. É, como os nossos leitores já sabem, um retrato pungente das nossas ruas, dos nossos jardins, das nossas praças, num tempo de ausência e de vazio causados pelo covid-19.

Depois, cinco clássicos, dois livros de Júlio Dinis, Morgadinha dos Canaviais e  As Pupilas do Senhor Reitor, outros dois de Eça, Adão e Eva no Paraíso A Cidade e as Serras e ainda um livro de António José da Silva, o Judeu, O Diabinho da Mão Furada, dominam um painel em que que se intromete O Pequeno Livro Vermelho de Mao Tsé-tung, em edição precedida por um texto fortemente crítico do editor da obra. Estaremos à beira de uma vaga neo-maoista?

Fecham a lista dos dez mais vendidos a edição de luxo de Tabacaria, de Álvaro de Campos em cinco línguas, o precioso estudo do recentemente falecido Roger Scruton, Como Ser Conservador, e outra novidade, número um na semana passada, Combates pela Verdade, Portugal e os Escravos, do historiador João Pedro Marques.

Eu, como editor, estou rendido ao gosto e às escolhas dos nossos leitores. E amanhã já voltamos a falar de vendas quando fecharmos o top 10 das vendas deste Maio do nosso tão tímido desconfinamento.

Feira do Pensamento e da Filosofia

Já sabem que eu sou só um eco da Guerra e Paz editores. Eles dizem e eu repito. Se estivesse nos vossos sapatos, ia a correr fazer estas compras. Que por acaso até podem e devem ser feitas de pés descalçados e em casa.

Eis o melhor da humanidade: o pensamento. E já acrescento: a liberdade de pensamento. Contra todas as velhas ditaduras, a de Salazar e a de Estaline, contra obscurantismos trump ou bolsonarianos, contra o insidioso e camuflado controle da ditadura chinesa o pensamento humano tem-se erguido e continuará a erguer-se, arrebatado, cristalino, inspirador.

O livro ama o pensamento. O livro nasceu, aliás, da aliança da linguagem e do pensamento. A Guerra e Paz orgulha-se de acolher no seu catálogo um vasto conjunto de títulos que nos oferecem rasgadas avenidas de liberdade, de reflexão, de interrogação sobre nós mesmos, sobre o sentido da vida e do universo. A começar por esta Apologia de Sócrates, em que Platão nos apresenta um filósofo, o seu mestre, que inaugurou essa ideia de que é dentro de nós mesmo que o processo de conhecimento se inicia e se estabelece que a razão é  só a razão nos pode guiar.

Juntámos esses livros e, neste tempo que devia ser o da Feira do Livro de Lisboa, criámos esta Feira do Pensamento e da Filosofia. Oferecemos-lhe 22 livros. Por preços de que nem vamos falar. E aos leitores cujas compras atinjam ou ultrapassem os 30€, ainda lhes oferecemos um livro gigantesco, de 30 por 30 cm, a edição de luxo de Fama e Segredo da História de Portugal, de Agustina Bessa Luís, os últimos exemplares da que foi a primeira edição publicada pela Guerra e Paz.

Temos nestes 22 títulos, livros de filosofia clássica, como a Breve História da Filosofia Moderna ou os Estudos sobre Heidegger, que teve o Prémio Pen Clube, mas temos também livros de filosofia política (Como Ser um ConservadorMemórias de Raymond Aron), filosofia da saúde (Testamento Vital), livros de intervenção social como os polémicos Destruir o Fascismo Islâmico e A Ideologia Afrocentrista ou Combates pela Verdade.

E queremos mesmo oferecer-lhe dois livros que ainda não chegaram às livrarias e estão em pré -compra. Um é o Porquê a Europa, Reflexões de um Sinólogo, um livro de amor à China e de veemente crítica ao actual poder, um livro que se interroga sobre as razões pelas quais a autonomia individual e a liberdade política foram sufocadas na cultural chinesa.

O outro, que só chegará ás livrarias a 26 de Junho, é Na Farmácia do Evaristo, de Fernando Pessoa, um texto quase desconhecido do grande público, um conto filosófico e político, na linha de O Banqueiro Anarquista, centrado numa tentativa de golpe de estado, que ocorreu em Lisboa, a de 18 de Abril de 1925. O que pensam as personagens de Pessoa de um golpe de estado? É legítima a insurreição de tropas que juraram fidelidade a um regime e à sua lei? Será toda a revolução uma traição, uma «aleivosia»? O que teria Fernando Pessoa escrito sobre o 25 de Abril se ainda estivesse vivo?

Esta é uma Feira para se pensar! Oferecemos 22 livros em que se encontra a serena alegria da descoberta. De Deus ao cérebro, num exame da consciência e da mente, dos cuidados do corpo à vertigem do suicídio, são livros que nos dizem e juram que o mundo é uma coisa estranha, afinal. De uma intensa beleza também.

Bem-aventurados livros que nos levam ao reino dos céus

A Guerra e Paz, em Maio, atira-se com toda a sede ao pote. Temos livros de combate e livros de puro prazer, para não dizer êxtase.

Lançamos-lhe um desafio. Faça uma pré-compra e beneficie de condições ultrajantemente excepcionais. É muito simples. Ora veja.

Não só tem um desconto de 10% em cada livro de que faça a pré-compra, como lhe oferecemos, se a sua compra for de 20€ ou mais, um livro lindíssimo, Contradança, com as cartas de Camões, e com a as ilustrações de um espião holandês que viajou para Goa infiltrado na corte do primeiro arcebispo português e, da Índia, mandou desenhos que revelavam a vida e os hábitos dos portugueses. São ilustrações extraordinárias desse terrível espião que dava pelo nome de Jan Huygen van Linschoten.

Se se entusiasmar e fizer uma pré-compra no valor de 40€ ou mais, não só lhe oferecemos a Contradança de Camões, como também um exemplar deste Livro de Agustina, a autobiografia que Agustina Bessa Luís escreveu pondo a língua portuguesa a roçar pelo mistério, insólito e contradições, como só ela era capaz de fazer.

E agora é só escolher os livros de combate e ideias ou os livros de prazer.

Nos primeiros, Combates pela Verdade, Portugal e os Escravos, da autoria de João Pedro Marques, é um livro que se confronta e ataca a leitura da escravatura proposta, por exemplo, por figuras como Fernando Rosas ou Fernanda Câncio. É um livro que se reivindica da História e dos seus métodos. Polémico em alto grau.

Testamento Vital, nos Dilemas Éticos do Fim da Vida, de um médico, J. Filipe Monteiro, traz-nos a uma discussão de que foi exemplo a recente situação da disponibilidade dos ventiladores em plena crise da Covid-19: até onde é que se deve levar a obsessão terapêutica e manter artificialmente ligado à máquina um doente sem cura. Saiba o que é o Testamento Vital.

E se quer conhecer as ideias de uma legião de novos autores das mais diversas áreas artísticas, ligado à Sociedade Portuguesa de Autores, de Boss A.C. a Rita Redshoes, passando por David Fonseca ou Maria Inês Almeida e Rita Vilela. Leia já estas entrevistas de Lugar dos Novos, uma co-edição da SPA com a Guerra e Paz.

Mas passemos ao sonho. Oferecemos-lhe, antes de mais, uma versão única de O Principezinho. Além do texto original integral, com as maravilhosas ilustrações, esta edição contém uma parte final em que se viaja pelo livro clássico com a apresentação de enigmas, perguntas e aventuras propostas pelo editor Manuel S. Fonseca. Não há nenhuma edição igual em Portugal.

Há mais duas viagens de puro prazer, ambas por Angola, mas muito distantes no tempo e no tom. Leia, de Onofre Santos, A Vida e Morte do Comandante Raúl Morales. É um mimo de amor e guerra, de combate e dança, de sedução e drama. Onofre Santos revela a sua pulsão sedutora e erótica. Ou será o comandante cubano Raul Morales, o protagonista, que domina o autor e o leva para onde quer?

Por fim, Estamos Aqui, de Branca Clara das Neves – com ilustrações prodigiosas de Neusa Trovoada –, em três línguas, português, kicongo e francês, é uma viagem pela cosmogonia kongo. Um livro mágico, encantatório, carregado de simbolismo, uma preciosidade estética, combinatória de ficção em que seres humanos e esculturas se tocam e confundem, subindo rio Congo acima, com passagem pelos lugares míticos que são Nóqui e Matadi. Um livro para ter na mão.

Basta comprar dois destes livros e Camões vai logo consigo. Com mais um jeitinho, e ligeira abertura do porta moedas, a grande Agustina logo se junta a Camões. Só mesmo na Guerra e Paz editores.

Queremos bons livros. O seu?

Também a Guerra e Paz passou pela quarentena. Uma das consequências foi não termos aceitado receber, durante Março e Abril, até hoje, dia 7 de Maio, os originais que autores ou candidatos a autores nos submeteram. Reabrimos hoje a recepção de originais. Os autores ou candidatos a autores podem enviar os seus potenciais livros para o email originais@guerraepaz.pt juntamente com uma sinopse e um mini-texto biográfico.

Um conselho que damos a todos os candidatos é o de lerem, primeiro, este texto sobre a nossa política de recepção de originais. É um texto pessimista, até um pouco desencorajador. Mas é um texto realista. Há, no mundo do livro, dois planetas distintos. Um é o da literatura. No romance, narrativa ou na poesia, um candidato a autor deve ser altamente exigente. Temos, na literatura mundial e na literatura em língua portuguesa, uma tradição que é preciso conhecer e depois pensar: conseguirei ombrear minimamente com essa tradição?

Desconfie da ideia de que tem jeito para a escrita. Desconfie dos amigos que acham muito giro tudo o que escreve, uns versinhos sobre a amizade, o sol e a lua. A escrita, em particular o romance a a poesia, exige novidade, surpresa, arrebatamento, emoção. Exige um invulgar domínio da língua portuguesa para não recorrer às frases mil vezes batidas, à fácil metáfora de um “fio de luz” ou do “homem lobo do homem”. O romance e a poesia são criação e só as grandes vivências, muitíssima leitura dos grandes livros e abundante transpiração de anos e anos de escrita autorizam a ideia de publicar.

Outro planeta, completamente diferente, é o da não-ficção. Nesta área, a Guerra e Paz está mais aberta a novos autores. Queremos publicar livros de actualidade, livros de sociedade, livros práticos, livros sobre temas históricos, sociológicos, económicos, ou até desportivos, que tragam informação e que sejam assinados por autores que têm conhecimento e experiência dos temas que abordam. Queremos livros que informem, que discutam as ideias feitas, seja sobre política, seja sobre a justiça, a violência, a guerra, as drogas, os conflitos étnicos ou de género. E sim, temos uma inclinação muito especial para livros que não sejam politicamente correctos.

Privilegiamos, é claro, livros que tragam apoios, livros que com facilidade permitam parcerias com entidades, sobretudo privadas, mas também públicas, parcerias que passem por compras prévias, por acordos que ampliem a divulgação na Imprensa ou nas redes sociais. Há quem se indigne com esta ideia de buscarmos condições financeiras prévias à publicação. É um preconceito que até a História da literatura do século XX desmente. O primeiro livro do poeta Philip Larkin, poeta genial e controverso, nasceu assim. E quem tenha lido as maravilhosas cartas que trocaram Jorge de Sena e o capitão João Sarmento Pimentel leu e leu bem que ambos pagaram, do seu bolso quando os editores (e eram prestigiados editores) não conseguiram viabilizar as edições.

Há, por fim, a regra fundamental: não queira saber de conselhos, nem os dos amigos, nem os da pessoa amada, e ainda menos destes que por aqui derramei. Acredite em si, obsessiva, teimosamente, e mande-nos o seu original. Já!