Mão na urna, cabeça em Hong Kong

Lusa
Foto da agência Lusa, reproduzida com a devida vénia.

Iam as minhas pernas a caminho da assembleia de voto e dou conta de que me andava a cabeça por Hong Kong. O que alguns milhões de chineses não gostariam de trocar os passos dominicais deles pelos meus. Eram 13 horas e Lisboa era uma janela aberta a uma luz fina, nítida, sem a sombra de Outono, que há de cair só quando o Sol se puser. As ruas do meu bairro cheias de plácidos transeuntes, tímidos aromas de almoço, o que me faz imaginar que ou se almoça fora ou as famílias se encostam a frescas saladas.

E já era a minha vez de votar. Lembrando-me de que só votei, em liberdade, pela primeira vez aos 24 anos, mas com a confiança de quem sabe que os portugueses votarão em quem muito bem querem e que este nosso pequeno mundo de equilíbrio e democracia não será abalado, vi a minha mão, sem hesitações ou tremura, enfiar o voto na ranhura. O que nós andámos para aqui chegar.

Véspera de eleições com Álvaro de Campos, engenheiro naval e poeta futurista

engenheiro

Página Negra — O sen­hor engen­heiro Álvaro de Campos importa-se, sendo amanhã dia de eleições, de nos dizer como é que na Inglaterra onde vive?
Álvaro de Cam­pos – Ainda há muita gente em Inglaterra que tem no íntimo da alma a con­vicção de que uma eleição geral é uma coisa no género e da cat­e­go­ria de uma lei da natureza, e de que a “von­tade do povo” é frase que com­porta qual­quer espé­cie de sen­tido.
PN — Tem noção de que na boca de um engen­heiro essas declar­ações vão provo­car escân­dalo?
AC – O que há de mais estranho nos indi­ví­duos políti­cos é o pouco que con­seguem apren­der com a exper­iên­cia fla­grante. Metem-se-lhes na cabeça cer­tas ideias, e atrav­es­sam a vida com essas ideias, emb­ora a exper­iên­cia quo­tid­i­ana­mente as desminta.
PN – Mas a maio­ria…
AC – A maio­ria é essen­cial­mente espec­ta­dora. As próprias eleições, dada a com­plex­i­dade e o custo do maquin­ismo eleitoral, nunca podem ser ven­ci­das senão por par­tidos eleitoral­mente orga­ni­za­dos. O eleitor não escolhe o que quer; escolhe entre isto e aquilo que lhe dão, o que é difer­ente. Tudo é oligárquico na vida das sociedades. A democ­ra­cia é o mais estúpido de todos os mitos, porque nem sequer tem carác­ter mís­tico.
PN – O sen­hor engen­heiro não me vai dizer que Por­tu­gal…
AC – Por­tu­gal é uma plu­toc­ra­cia finan­ceira de espé­cie asin­ina… uma oli­gar­quia de sim­u­ladores provin­cianos, pouco indus­tri­a­dos na própria his­te­ria postiça.
PN – Des­culpe sen­hor engen­heiro, mas não se pode falar con­sigo. Digo-lhe já, há decerto out­ros engen­heiros, futur­is­tas ou não, que não pen­sam como o sen­hor.
AC – “Quem não intruja não come”; é esta a forma soci­ológ­ica dum provér­bio que o povo não sabe dizer, porque o povo nunca sabe dizer nada… As farsas não me divertem.
PN – **!!##??? Ora batatas, engenheiro Álvaro de Campos.

alvaro-de-campos

 

De costas viradas

Bica Curta pós eleitoral, servida no CM, 3.ª feira, dia 28 de Maio

eleicoes-europeias

Saiu curta a bica eleitoral: 68,6% dos portugueses não a beberam. À Europa, abrimos os bolsos e viramos as costas. É desprezar o único cenário de futuro digno. Na Europa, a extrema-direita cresceu. Menos do que se temia; o suficiente para esvaziar a essencial e necessária direita democrática, em países chave. Em Portugal, a brutal abstenção e o recuo da direita democrática abrem portas a populismos. Precisamos que a negra bandeira dos extremismos – segurança, identidade, imigração – seja, na Europa, chamada sem medo a debate. Direita e esquerda têm de tirar de mãos extremistas o falso pão que fingem levar à boca do povo.