Numa das minhas espartanas razias pela televisão, apanhei na SIC uma bela reportagem de Aurélio Faria sobre a corveta Afonso Cerqueira. Era uma corveta cheia de História, como todas as corvetas, ou como todos nós que navegamos a vida como num oceano deslizam corvetas. Hoje, a corveta está no fundo do mar.
E vi, nessa corveta no fundo do mar, feita recife ao largo da Madeira, o meu destino. Na morte da corveta a minha morte. A sua também. A de todos os nossos amores amigos, afinal. Todos acabaremos recifes no fundo do cosmos sem fundo. Tal como a heróica corveta Afonso Cerqueira que, seja por onde quer que se entre, oferece sempre uma segunda saída aos aquáticos visitantes, por mim, por si, pelo meio desses suspensos recifes, que estamos destinados a ser no fundo do cosmos, nadarão mergulhadores, o impertinente esquecimento, as cegas águas da eternidade, robalos e douradas galácticas, as despenteadas algas de Deus. Por onde quer que metafisicamente nos entrem, esses cósmicos visitantes encontrarão sempre a nossa segunda e oferecida saída, roído buraco, mais de olvido do que de saudade, do sono ou sonho que tenha sido a nossa remota vida.
Se me permitem dizê-lo, é a primeira vez que a eternidade me apetece.