Que alegria é esta que é tão triste! A voz desta mulher vem do peito, da garganta, mas não sai só pelo desenho lindo da boca. Sai pelos olhos, pelas narinas, pelas dramáticas maçãs do rosto. Mesmo sem a estarmos a ver, a cada palavra que liberta, sentimos o rosto dela contrair-se, expressiva, aliviada, dolorosamente.
Maysa, aristocrata brasileira, filha do barão de Monjardim, casou aos 17 anos, nos já longínquos anos 50, com um empresário poderoso, André Matarazzo, homem com o dobro da idade dela. Teria sido uma grande história de amor se ele, masculino digo eu, possessivo desculpá-lo-ão outros, sempre os mesmos, não a tivesse querido impedir de cantar.
Maysa deixou-o, cantou sempre e amou com exuberância, construindo um mito. Para ela, imagino, inaugurou-se o voo Rio-Tóquio, para que fosse a primeira brasileira a cantar na televisão japonesa. Em vez de malas, levou a Bossa Nova a Nova Iorque e a Paris.
Na voz dela, toda a manhã, toda a aurora, é ainda profunda, inevitavelmente nocturna.
Já sei o que vou fazer no dia deste ano em que hei de fazer anos: ouvir e talvez dançar Maysa Sings Songs Before Dawn como ela o gravou para a Columbia Records, disco mítico, quase todo em inglês. Dizem-me é mais do que canções, música, voz, mais até do que uma mulher. Alegria recheada a tristeza.