Convido-vos a deixarem-se agarrar pela cintura pelo longo braço dos livros de Junho.

O Longo Braço do Passado é o grande livro de Junho da Guerra e Paz editores. Cada página desse romance de Rui de Azevedo Teixeira me puxou também para o passado, arrastando-me até à infância em que eu lia livros de devoção como A Vida de Jesus, edição popular de Raul Correia, que este mês publico.
Voltei, à conta d’O Longo Braço do Passado, ao ramo da mangueira, a árvore onde, menino e moço, lia: podia ter lido ali as extraordinárias aventuras de À Espera de Bojangles, de Olivier Bourdeaut, ou o delírio fantástico e assustador de Nas Montanhas da Loucura, de H. P. Lovecraft, dois romances exaltantes de Junho, na Guerra e Paz.
O Longo Braço do Passado, história de um português que vai a Angola e mata, é tanto uma viagem no tempo quanto o livrinho científico de Ludovic Orlando, O ADN Fóssil, uma Máquina para Viajar no Tempo, ou como o rigoroso ensaio histórico de João Pedro Marques, Revoltas Escravas. No romance de Rui de Azevedo Teixeira, como nestes ensaios, perpassa a inquietação e a insatisfação de quem não se resigna a ideias tépidas e anestesiantes.
A vida, uma vida a estalar de contradições, uma vida de elegância e violência, com a memória de guerra do oficial comando que foi Rui de Azevedo Teixeira, atravessa O Longo Braço do Passado, como atravessa as Crónicas de Sebastopol, em que Tolstói narra a sua experiência das batalhas da Crimeia. Estão juntos, estes livros, em Junho: acompanha-os Eunice Muñoz: Fotobiografia, obra repleta de fotografias de vida e de palco, belíssima homenagem com o patrocínio da Fundação Calouste Gulbenkian.
O Longo Braço do Passado, romance que inaugura a colecção Arquipélago, doravante a colecção de romances contemporâneos de língua portuguesa, é um território de sombrias intuições e de vivos e agudos instintos. Foi a esses instintos que recorreu o economista espanhol Fernando Trías de Bes para nos explicar como as emoções mudaram o curso da Humanidade, em Uma História Diferente do Mundo. São outras as emoções que Lisboa despertou em Fernando Machado Antunes, que nos convida à mais lírica e fadista das deambulações em … como que lisboandando, o seu primeiro livro de poesia na Guerra e Paz.
Este é o nosso mês de Junho, com dez novos títulos, a que um romance, O Longo Braço do Passado, oferece um périplo pungente: Paulo de Trava Lobo, o seu herói, leva-nos a Lisboa e ao Porto, a Luanda e ao Lubango, à Bulgária e à Alemanha, numa peregrinação de risco, sexo e morte, que só o amor à literatura resgata. Um grande romance português.
E são estes, um a um, os livros de Junho
Nas livrarias a 14 de Junho


À Espera de Bojangles, Olivier Bourdeaut
Um romance narrado do ponto de vista de uma criança: com euforia e encanto. Os pais vivem com exuberância, música e champanhe cada minuto do dia. Pode a exaltação estilhaçar-se como um cristal?
Nas Montanhas da Loucura, H. P. Lovecraft
Uma das obras-primas de Lovecraft: nos píncaros da loucura, um mergulho no gelo mortal da Antárctica. Um grupo de cientistas descobre uma civilização inumana adormecida. Tensão, horror e morte.
… como que lisboandando, Fernando Machado Antunes
Lisboa visitada pela lírica, pela sintaxe e pelo vocabulário de um poeta que não consegue deixar de ser caluanda. Há versos de fado, há um lirismo musical nesta Lisboa em rima.
Revoltas Escravas, Mistificações e Mal-Entendidos, João Pedro Marques
Foram as revoltas escravas que acabaram com a escravatura? Quando foram bem-sucedidas, será que os escravos triunfantes criaram sociedades não-escravistas? Um livro essencial para o debate sobre a emancipação dos escravos.
O ADN Fóssil, uma Máquina para Viajar no Tempo, Ludovic Orlando
Um grande livro de divulgação científica: o ADN fóssil não só nos ajuda a escrever a História, como pode mesmo reescrevê-la, desfazendo mitos e preconceitos. É essa a grande viagem a que o cientista, seu autor, nos convida.
A Vida de Jesus, texto de Raul Correia, ilustração de Carlos Alberto Santos
Um livro popular que a Guerra e Paz recupera. Uma escrita simples que dá todo o protagonismo aos episódios centrais na vida de Jesus. As ilustrações reforçam a inocência.
Nas livrarias a 28 de Junho

Eunice Muñoz: Fotobiografia, texto de Fátima Morais
Um álbum magnífico: todas as imagens dos momentos mais marcantes da obra de Eunice Muñoz, mas também da sua vida em família. Toda a carreira teatral, cinematográfica e televisiva retratada nesta obra de grande qualidade gráfica, só possível com o patrocínio da Fundação Calouste Gulbenkian.
Crónicas de Sebastopol, Lev Tolstói
Está aqui, em carne viva, a Guerra da Crimeia, de 1855. Tolstói foi tenente nessa guerra. Relata os acontecimentos cruciais que viveu, desenhando aqui o esqueleto do que vai ser a sua obra-prima, o romance Guerra e Paz. Lida hoje, com a guerra da Ucrânia em fundo, é impressionante.
O Longo Braço do Passado, Rui de Azevedo Teixeira
Um ex-comando português vai dar aulas de literatura numa universidade angolana: começa aqui um périplo atormentado, de amor e violência. Pode haver um crime justo? Um romance português que privilegia a narração dos factos. Por mais crus, por mais brutais que sejam. Um livro poético e duro, belíssimo, que inaugura a colecção Arquipélago.
Uma História Diferente do Mundo, Fernando Trías Bes
Neste livro, o economista e escritor espanhol Fernando Trías Bes mostra-nos como as emoções e os instintos foram a chave para o desenvolvimento da Humanidade: o comércio, o câmbio, os seguros, a moeda são inventos que os humanos criaram para se salvar da violência.
Boa noite, Manuel.
Nunca mais comentei porque o blogue tornou-se quase uma página da “Guerra e Paz” (perfeitamente compreensível, primeiro com a pandemia, agora com a guerra…).
Mas tenho de deixar aqui o meu aplauso pela sua capacidade de reinvenção, enquanto livreiro.
Excelentes livros (o bom gosto não foi embora). Há pelo menos dois que comprarei.
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Olá Luis Eme. Eu ando muito distante deste mundo virtual. Obrigado pela sua paciência e pela sua análise dos livros da G&P. Eu ando encantado com eles.
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