Outras Bicas Curtas que tinham ficado para aqui esquecidas. Acolheu-as o CM e eu, hoje, uma semana e meia depois, trago-as aqui para a conversa.

Um menino de 6 anos
Confiança. Puxei pela memória e era essa, quando tinha 6 anos, a palavra-passe para enfrentar o mundo. Eu tinha confiança no que o meu pai me dizia. Em Maio, teremos de sair de casa com confiança, vencendo o medo, como um menino de 6 anos.
Confiança para os pais deixarem os filhos à escola e voltarem ao trabalho. Confiança num Governo que reconheça que esta primeira refrega foi um hercúleo esforço para evitar a ruptura de um SNS tão heróico como debilitado. Confiança num Governo que tenha a coragem de nos dizer que teremos de coabitar com um vírus vagabundo, a um passo da infecção, por vezes da morte, e que a isso se chama vida.
A herança
Com 30 anos de idade, a minha filha já me está a dar uma abada: 4 a 1 em traumas. Eu, aos 20, vivi e participei na independência de Angola, o que pôs de pantanas todo um mundo e um modo de vida. Mas a minha filha já soma quatro traumas, em idade juvenil: o 11 de Setembro, que pintou os nossos dias com a sombra do terrorismo; a crise do subprime, com a sua bolha imobiliária a arrastar a banca pela rua da amargura; a crise das dívidas soberanas que pôs Portugal de joelhos; e agora este vírus vadio.
Quatro crises, tantas sombras, muitos sonhos adiados. A geração da minha filha, dos nossos filhos, merecia ter recebido outra herança.
“(…) a isso se chama vida.”
Nem mais, a confiança para gerir os riscos do dia-a-dia.
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Nem mais, Diogo. Plenamente de acordo.
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Estamos todos – novos, velhos e assim assim – prestes a entrar na pior crise de que há memória.
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Não obstante, e por honra da sobrevivência, vamos à luta. Somos um animal persistente, teimoso e razoavelmente bem equipado, mesmo contra os neo-neo-vírus.
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Se palavra e pensamento estão intrisecamente ligados, e ambos ditam a forma como sentimos, então o discurso só pode ser esse.
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como meninos de 6 anos. No meu caso, já duas vezes 6…
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Não sei se é a pior crise, talvez seja, joga em roleta russa com a vida de cada um à escala global. Voltar à confiança dos seis anos não é possível, somos outros de nós. E não se volta a coisa alguma. Como sabe. É aprender a confiar do princípio, neste mundo de agora. Se formos capazes.
Quanto à geração dos nossos filhos, a herança é o que mais lamento. Tanto lutei para que não sofressem de mundo como o meu, estudassem sem dificuldade, curtissem a universidade como eu não consegui, vivessem cada fase da vida sem o atropelo de serem adultos antes do tempo. Não me lembrei desta herança global que tudo muda e onde sou irrisória amiba.
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Voltamos sempre à antiquérrima confiança. Sentados numa cadeira ou no chão, uma fogueira a arder à nossa frente, um copo seja do que for na mão.
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