Eram 10 horas de uma manhã do Verão de 1958. Tipos que nunca tinham visto a luz do sol e que há quatro décadas enchiam de música, fumo, lendas, as noites e as wee hours de Harlem, começaram a aparecer de todo o lado.
A ideia nasceu na revista Esquire, cujo editor era Robert Benton, futuro realizador de cinema, que se lembrou de celebrar o que ele achava ser a golden age of jazz com uma fotografia de grupo. A encomenda caiu em cima do mais improvável executor, Art Kane, que nem fotógrafo profissional era, mas a quem Benton reconhecia talento e paixão pelo jazz.
Kane era pouco mais do que um miúdo e nunca tinha feito uma fotografia profissional. Miserável, não tinha nada, nem agência, e muito menos um estúdio. Caçou com gato: decidiu fazer uma foto de rua, no certíssimo cenário, uma rua de Harlem, casa e escadaria típicas do bairro. Conta a lenda, deve ser verdade, que andou a passar palavra entre os músicos para que aparecessem a uma hora que muitos nem sabiam que existia.
Vieram 58 músicos, com todos os estilos: bebop, swing, hard-bop, big band, dixieland. Alguns deles são dos criadores mais geniais do século XX: Dizzy Gillespie, Lester Young, Thelonius Monk, Sonny Rollins, Horace Silver, Art Farmer, Art Blakey, Charlie Mingus, Gerry Mulligan, Count Basie. Arrumaram-se como agora os vemos, Count Basie sentadinho ao lado da fila de miúdos do bairro que vieram assistir à festa, Gillespie o último à direita. Mas podem saber quem é quem nesta visita guiada.
E às 10 horas da manhã, Kane, mais nervoso do que noiva virgem em noite de deixar de sê-lo, disse olha o passarinho e clicou para a posteridade. Não deu conta que Willie “the lion” Smith, pianista virtuoso, mas cansado, se tinha sentado nos degraus da porta seguinte e ficado fora do enquadramento. Com 58 soberbos músicos, menos um, Art Kane acabava de fabricar “Harlem, 1958” um dos prodígios (tão simples) da iconografia do jazz.