Tenho uma malapata com o escritor Malcolm Lowry. Adoro-lhe a turbulência, as bebedeiras e o Debaixo do Vulcão (Under the Volcano para o caso do meu amigo Victor Melo e a sua Lídia estarem em Massachussets, no meio da neve, a ler esta prosa).
E do Vulcão comprei já 158 exemplares. Não confundam esta amarga precisão com jactância: juro não comprar nem mais um. Mês a mês, comprava um livro e dois desapareciam. Quando chegava a Feira do Livro pedia desconto nas bancas e trazia uma dúzia. Os Vulcões entram-me em casa e desaparecem de mansinho: evaporam-se, volatilizam-se.
Um amigo mandou-me o epitáfio de Lowry:
Malcolm Lowry,
Perdido e achado em Bowery,
Se a sua prosa floria,
Por vezes também deprimia,
Vivia de noite,
E bebia de dia,
E morreu de pé,
A tocar o Ukelele.
Parafraseando o epitáfio, também os livros entravam de noite, desapareciam de dia. Seja o que for é uma coisa que lhes dá. Não tenho nem um. Sou espírita — se vivesse no Brasil seria pai-de-santo. Não interessa, nem invocando o espírito argentino e labiríntico de Borges consegui achar as ruínas circulares onde estes livros vão parar. Indigno, reconheço que o mescal é uma estranha forma de refutar a realidade, mas, nos meus momentos mais alucinados, acredito que exista algures uma biblioteca de perdidos e achados onde um dia, comovidos e fraternos, eu e os 158 Vulcões nos reencontraremos.
P.s. – Escrevi este texto há anos. Comprei, entretanto, o centésimo quinquagésimo nono Vulcão. Fui agora, depois de começar a escrever este texto, vê-lo à estante. Já lá não está.