Foi assim como assim, como quem não quer a coisa, mas submeteram-me ao Questionário de Proust, assim chamado por terem ganho fama as genuínas respostas que o celebrado autor lhe deu. Respondi.
1.O que é para si a felicidade absoluta?
R- Estar sentado num fim de tarde de Verão, na mesa um fino estarrecedoramente gelado e um prato de jinguba. E Deus sentado, ali ao lado, sendo certo e sabido que Deus é Amor e só Amor
2.Qual considera ser o seu maior feito?
R- É só meio: a minha filha; a outra metade do feito é da minha mulher.
3.Qual a sua maior extravagância?
R- Ter conseguido atrasar um voo na placa do aeroporto de Nice jurando ao telemóvel que estava mesmo a chegar vindo de Saint Tropez.
4.Que palavra ou frase mais utiliza?
R- Komé que é, meu kamba?
5.Qual o traço principal do seu carácter?
R- Uma certa bonomia.
6.O seu pior defeito?
R- Levar muito a mal quando levo a mal.
7.Qual a sua maior mágoa?
R- Ter desaparecido o bairro colonial de Luanda da minha adolescência. Seria injusto, prenhe de conflitos e descriminação, mas era tão exaltante nas suas misturas de cheiros, de culturas e de ideais.
8.Qual o seu maior sonho?
R- Conversar um dia com um ressuscitado Joseph Conrad. Ele pode vir com o fato imaculado de Lord Jim.
9.Qual o dia mais feliz da sua vida?
R- O 10 de Junho de 1977, estava Jorge de Sena a discursar, no Dia de Portugal. Nem era bem o que eu ouvia, era mais a mão que estava na minha mão.
10.Qual a sua máxima preferida?
R- A da Ordem da Jarreteira: Honni soit qui mal y pense
11.Onde (e como) gostaria de viver?
R- Vizinho de Paul Gauguin nas ilhas dos Mares do Sul
12.Qual a sua cor preferida?
R- Vermelho, rojo, red, rouge, rosso.
13.Qual a sua flor preferida?
R- Rosas.
14.O animal que mais simpatia lhe merece?
R- Águia. Que liberdade! (faço notar que é o único ponto de exclamação das minhas 30 respostas)
15.Que compositores prefere?
R- Quase todos, mas agora apetecia-me ouvir Pachelbel. O Canon.
16.Pintores de eleição?
R- Picasso. É tão simples.
17.Quais são os seus escritores favoritos?
R- Pelo amor dele a outros mil escritores que também amo, Jorge Luis Borges.
18.Quais os poetas da sua eleição?
R- Larkin e Herberto. Ou talvez Herberto e Larkin. Olhe. Não sei bem.
19.O que mais aprecia nos seus amigos?
R- A torrencial generosidade de serem meus amigos.
20.Quais são os seus heróis?
R- O meu pai, pela bondade; a minha mãe, pela inteligência discreta.
21.Quais são os seus heróis predilectos na ficção?
R- O odioso Ethan, que John Wayne incarna em The Searchers. Por ser uma figura de redenção.
22.Qual a sua personagem histórica favorita?
R- Churchill: não fez revoluções, louvado seja Deus.
23.E qual é a sua personagem favorita na vida real?
R- Já morreram: o senhor Alberto e o senhor Gil, funcionários da Cinemateca no tempo de João Bénard. Incarnavam a vida como ela era. A pensar neles há um véu de nostalgia que me tapa com pudor os olhos.
24.Que qualidade(s) mais aprecia num homem?
R- A sensibilidade.
25.E numa mulher?
R- Um grão de virilidade.
26.Que dom da natureza gostaria de possuir?
R- O da cíclica reincarnação.
27.Qual é para si a maior virtude?
R- Uma indolência inteligente e produtiva.
28.Como gostaria de morrer?
R- Ainda vivo.
29.Se pudesse escolher como regressar, quem gostaria de ser?
R- Alguém que gostasse de estar sentado num fim de tarde de Verão a beber um fino gelado e a comer um prato de jinguba.
30.Qual é o seu lema de vida?
R- Ama e faz o que quiseres.
Desconheço as respostas de Proust, mas as suas não deixam um português envergonhado. Onde quer que as dê. Por alguma razão demos mundos ao mundo. Haja Deus. Nem que seja para se sentar em Amor ao lado do Manuel que bebe e come o que lhe apetece. E, acrescente-se, dá-lhe a mão.
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Eu sou só um obsessivo da nostalgia. Obrigado pelas boas palavras.
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