Naquele tempo, o meu tempo, quando um tipo era aleijado jogava à baliza. Era um tempo em que, estando por inventar a palavra deficiente, ainda se dizia aleijado. O medo da poliomielite pairava no ar. Philip Roth, no seu “Nemésis”, mostra esse indecifrável inimigo. Não se sabia donde vinha, nem como chegava.
A polio podia, dizia-se, começar na praia ou num picnic, com um pico, um prego ferrugento, um espinho envenenado que se espetasse no calcanhar. Era o que, mal lidos, diziam os pálidos Reader’s Digest que nos chegavam com atraso. Não tínhamos sequer noção da morte: tínhamos era medo de ficar paralíticos. E de ter de jogar à baliza.
Conheço um garoto que joga à baliza. Passou a jogar nessa posição depois de ser avançado no jogo que mais gosta de jogar e onde perdeu horas e horas a organizar campeonatos infantis e mais tarde juvenis para poder jogá-los. Num repente lhe disseram que não podia jogar mais. E ele incrédulo, como se fora coisa impossível, “está a dizer-me que não posso jogar mais?” Sempre que joga à baliza, durante dois dias, fica “todo partido”. Diz ele. E já tenho confirmado. O acaso genético estraga muita coisa que só ensombra. E, ainda assim, bem vejo a alegria com que, de tempos a tempos consegue recrutar dez a onze jogadores.
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Manuel: artigo à parte, gostei que me lembrasse que ainda existe a palavra aleijado. Deficiente anda a nossa língua onde os sinónimos rareiam. Portugal acabou com os cegos (que bom!), agora há que cuidar dos invisuais. E este país não é para velhos mas apenas para idosos. Abaixo o lixo! Vivam os resíduos sólidos urbanos!!!
Goooooooooolo!!!
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Olá Gonçalo, há pruridos que têm o disparate imbuído até ao tutano. Estamos juntos. Um abraço
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