Se já estão embalados pela doçura das ondas, as carícias do sol a aflorar a pele, peço desculpa pela interrupção:
mas não deixem é de ler um livro. E obrigado por lerem esta newsletter

«Os meus livros de Agosto» vêm peticionar, subscrever e ovacionar toda e qualquer moção a favor da silly season. Pezinhos na água e um sabor a sal, eis do que a nossa humilde humanidade precisa. E depois, sim, lá para o fim de Agosto procurem estes livros.
A silly season, como gourmet e deliciadamente Jorge de Sena nos lembra no Reino da Estupidez II, já vem de longe: e este é o livro em que um Sena totalmente fora da caixa nos leva a um «festival de besteira». Nunca a prosa de Sena esteve tão inundada de riso, mesmo se o riso roça a amargura: dos ossos de um imperador à reportagem revolucionária numa sessão de esclarecimento durante o PREC, há aqui cavalos de seis pernas, uma entrevista ao fantasma de Camões, e aventuras onomásticas como as do pai que, por promessa à Senhora da Aparecida, se o curasse de impertinente doença de má vida, chamaria, e chamou, à filha Sífilis e ao filho Diagnóstico.
E tomem lá um livrinho com sabor a sal. É de Victor Correia e perfaz uma tetralogia: às três antologias de poemas eróticos – antiguidade, cancioneiros medievais, frades e freiras, todas da Guerra e Paz – junta agora Sexualidade e Erotismo na Bíblia Sagrada. Se Sena me perdoa o roubo, diria que no livro se erguem episódios e histórias em que «o Homem põe-se e Deus dispõe-se». Fervem adultérios, incestos, nudez, muito pecado, o Senhor seja louvado.
Com um sorriso mais distendido é que se vai ler o gosto de ficção que Luis Alvellos nos oferece em O Ex-Futuro Primeiro-Ministro. O Luis (ele pede-me que escreva sempre sem acento) estreou-se comigo na poesia, Das Margens do Meu Rio, e a prosa confirma a agilidade de escrita, o amabilíssimo humor tintado por breves nuvens de vulnerabilidade e solidão. E há, no livro, um sujeito gordíssimo que gosta de dar – e tem esse direito – um murro no ombro a um ministro. Também gostavam?
Maré vazia, maré cheia, o que nada tem que ver com silly season, é Poucos Mas Bons, Portugal e a Sua Marinha no Combate ao Tráfico de Escravos, ensaio de Jorge Moreira da Silva, especialista na História da Marinha. Conta-nos o lado que agora se tende a ocultar, o da acção proactiva e destacada da nossa Marinha, no século XIX, no combate ao tráfico de escravos. Também temos méritos, haja Deus!
E há viagens mais curiosas do que outras: A Palavra ao Grão-Mestre, Os Desafios da Maçonaria Regular Contados por Dentro desvenda o que a muitos de nós continua a parecer misterioso, porventura insondável. E insondável é o que agora deixa de ser, ao sermos conduzidos em visita pelo autor, Armindo Azevedo, Grão-Mestre da maior obediência maçónica. Vale a pena ouvir.
E eis a pré-rentrée literária. Cai-nos do céu um Machado de Assis, Pai Contra Mãe, que tem pela primeira vez (no mundo, no mundo, diria eu), uma edição individual. O conto é um dos raros confrontos de Machado de Assis com a escravatura, com uma trama que é do mais arrepiante e convulsivo que se possa imaginar, protagonizada por um caçador de escravos fugidos. Outro conto e algumas crónicas, sobre a escravatura do seu tempo e o Dia da Abolição a que assistiu, completam esta obra única de Machado de Assis, que outro autor brasileiro, Paulo Nogueira, prefacia com garbo.
Se me estão a ver a correr pela areia já a mergulhar nos livros de Setembro? Sim, estão! E traremos surpresas, um livro em que Salazar diz o que quer da boca para fora, outro com os eufóricos amores de cavalos e ranchos de A Lua e a Maré, e a conclusão – a tiro, está claro – da trilogia A Vida Aventureira de Um Homem de Letras, de Rui Azevedo Teixeira, em que se fará, comme il faut, o elogio da dureza.
Vou-me pelo, para mim desconhecido, conto de Machado de Assis. de quem sou fã incondicional. E suponho já ter o assinalável e assinalado de Jorge de Sena. Os outros também me parecem interessantes mas há que dar espaço a outras editoras:).
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Boa escolha, a do senhor dom Casmurro Assis: é divino.
Agora uma dúvida: outras editoras? 🙂 🙂
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Atão o jovem não é editor da Guerra e Paz? Pois se não, as minhas desculpas. Pensei que os livros apresentados pertenciam a essa editora. O meu livro de Jorge de Sena é.
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Claro que sou… Mas o que quero é que invista toda a sua fortuna só na minha editora 🙂 As outras? já são riquíssimas 🙂
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Ah, isto fica à espera de moderação. Acho muito bem, sem moderação / caímos no vulcão. Já lá estão Empédocles e Lowry.
Como nos anos 80 andavas na alta cultura, não deves ter reparado nas ruas, deixo esta consideração…
https://feriadoauportugal.blogspot.com/2024/08/prestacao-no-breaking-fez-de-rachael.html
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Maturino
eu, alta cultura é só quando te leio 🙂
E o que é isso de moderação? Na Página Negra? Não há! Deve ser o sistema por tu carregares links….
Escreve sempre e dança. No começo do século XX, começara a ser famoso na Europa essa forma de breakdance chamada tango, perguntaram a Monsenhor Duschene, um bispo francês, o que pensava daquilo. Respondeu: “Pergunto-me é o porque é que o dançam em pé!”
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