
“Se o pénis dele não fosse tão maravilhoso, tê-lo-ia deixado há muito!” Foi o que escreveu Carole Mallory na biografia, “Loving Mailer”, que dedicou ao escritor, seu amante durante nove anos. Estou a falar de Norman Mailer, o autor de um tremendo livro de guerra, “Os Nus e os Mortos”, um dos grandes romances americanos do século XX.
Carole publicou as suas memórias de Mailer já três anos depois da morte do escritor, o que significa que podia ser sincera sem risco de vida, por estarem os temíveis punhos de Mailer em sossego e descanso no irrevogável caixão.
O livro saiu, aliás, no mesmo dia em que a última mulher de Mailer, Norris Church Mailer, publicou também outra acalorada biografia, “A Ticket to the Circus”, e numa coisa o sólido testemunho de Norris coincide com o de Carole. Referindo-se ao mesmo atributo de Mailer que Carole louvara, Norris chama-lhe, e peço desculpa pela sincera ternura do palavrão que ela usou, um “esplêndido caralho”.
A incomensurável vaidade de Norman Mailer deve ter explodido no seu caixão em sonoro fogo de artificio. Arthur Miller, o escritor que casou com Marilyn Monroe, e que viveu alguns anos no mesmo prédio de Mailer, lembra-se de Norman ainda ele um chavalo, acabadinho de sair da tropa. Norman veio ter com ele e apresentou-se como escritor. Disse a Arthur que vira e gostara da sua peça “All Our Sons” e que era também capaz de escrever uma peça igual. Arthur não conseguiu conter o riso, impressionado com a convicção e a prosápia daquele novato.
Alberto Moravia, o italiano autor de “Duas Mulheres”, conta que conheceu o megalómano Mailer, no lançamento da nave Apollo 11, que chegaria à Lua. Moravia e Mailer foram convidados a escrever sobre o tema. Lembra o italiano: “Ele escreveu um livro de 500 páginas, eu escrevi três crónicas.”
Se as duas biografias confirmam a pulsão para o excesso e a inadjectivável vaidade desse judeu que um dia José Cardoso Pires foi encontrar em Brooklyn, como numa longa noite de copos, no Festival de Cinema de Tróia, nos contou, ao lado do Fernando Lopes, do Dinis Machado, do Pedro Bandeira Freire, desse bando de Tróia, de que, agora, só estamos vivos a Antónia, o Setúbal, o Zé Navarro e eu, também é verdade que as duas biografias mostram um homem mais amoroso do que a sua propalada e lendária incapacidade de compreender e aprender com as mulheres.
Que Norman Mailer é o dessas biografias? Não parece ser o mesmo que na edição do 50.º aniversário do seu “Os Nus e os Mortos”, escreveu no prefácio: “Odeio tudo aquilo que não seja eu próprio.” Esse seria o Mailer da ficção pura. Na vida, conta Norris, a sua mulher, que foi ela que um dia lhe deu um indesmentível murro nos queixos no meio de uma viva discussão.
Se com a última amante e a última mulher só houve doçuras, os seis casamentos de Mailer e a mariana procissão das velas que poderia fazer-se com as suas aventuras de esfuziante adúltero praticante contam outra história. Esfaqueou uma das suas seis mulheres durante uma festa de alcoólico dilúvio, tendo de ser internado numa clínica psiquiátrica. Porém, Norris e Carole insistem: Mailer era quase um mentor, insistia mesmo para que elas escrevessem. E ambas são mulheres com vida e liberdade amorosa própria antes de conhecerem Mailer, Norris foi amante de Bill Clinton, Carole de De Niro, Warren Beatty e Clint Eastwood.
Sem desprimor, quem poderá ter memória tão comovente como a da primeira noite de Carole e Norman? Escreve Carole que ele lhe disse: “Despe essas lindas cuecas. Quero provar a tua alma!”